Além
dessa gravidez, deixou lá em Portugal, um casal de filhos: Joaquim, nascido em
1931 e Maria Fernanda, nascida em 1942. Sendo comunicada desta oportunidade
dirigiu-se ao endereço a ela fornecido: Rua da Carioca nº 5, sala 802. Lá,
encontrou, Arnaldo, o cunhado da senhora doente e este gentilmente, deu um
telefonema ao irmão que se encontrava àquela hora no hospital e falou-lhe da
pessoa que estava à sua frente candidatando-se para o cargo. Este, pediu ao
irmão que a encaminhasse ao hospital que lá estaria à espera. E, assim, colocada
num táxi por Arnaldo, ela foi ao encontro deste homem amargurado e tão sofrido.
Encontrou-o à sua espera na portaria do hospital e, ali conversaram, acertaram o
trabalho e salário que, para ela, na ocasião, era uma verdadeira fortuna.
Imediatamente pôs-se a tratar da doente que simpatizou muito com ela, fez
amizades com as freiras, principalmente com as Irmãs Cira e Adelina. Sua filha
passava dias numa casa de uma conhecida, dias em casa de outra, na casa do irmão
e, assim transcorria sua vida. Não saía de lá um só dia e, normalmente, seu
irmão, levava a filha para visitá-la. Com as economias que havia feito
anteriormente, conseguiu trazer seu filho Joaquim, então, já casado e com um
filho de 2 anos de idade, para morar no Brasil, com moradia, arranjada por sua
amiga Amélia e emprego prometido, isto em 1960. Sua pequena filha ainda chegou a
passar dias na casa do filho, mas, devido à brutalidade com que este tratava a
menina, ela preferiu deixá-la como anteriormente descrito. Esta menina travou
conhecimento com a paciente de quem a mãe cuidava e, desde cedo, sentiu um
carinho enorme por aquele senhor que nunca deixou de conversar e dar atenção a
ela. Ele, acabou conseguindo um quarto pequeno, naquele mesmo andar onde a
menina e a mãe pudessem estar juntas. E a menina passou a fazer parte da rotina
daquele andar também: conhecia a todos, conversava com enfermeiras, irmãs,
médicos, pacientes. Aquele hospital começou a ser o seu lar. O tempo passava e,
a cada dia,D. Carlinda piorava: o câncer estava avançando rapidamente. Os
médicos já mal conseguiam localizar veias para administrar-lhe a medicação.
Cortavam sua carne em busca de veias mais profundas. O sofrimento desta era
pavoroso. Já lá se ia mais de um ano essa agonia. O marido era tristeza pura, um
ser impotente diante de mais outro golpe traiçoeiro do destino. Em outubro de
1961, ela entrou em coma profunda. Embora, os médicos dissessem que ela não
sentia nada naquele estado, sua expressão de dor era visível em seu rosto a cada
vez que tinha de ser submetida a um novo corte para localização de novas veias.
Em 26 deste mês e ano , faleceu. Foi enterrada junto às filhas no túmulo da
família. |
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A partir daí, passam os três a morar em Santa Teresa. Nessa época a casa contava com seis empregados: uma cozinheira, uma arrumadeira, uma lavadeira e passadeira, um jardineiro, um motorista para o seu Oldsmobile. |
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Uma governanta, chamada D.Custódia, que já estava lá há mais de quarenta anos e que mantinha a casa em ordem e funcionamento. Esta senhora era a mãe do então chefe de escritório, sr. Emygdio Rodrigues Caetano. D. Custódia ainda ficou algum tempo na casa, mas por problemas de saúde, foi internada na Ordem Terceira de São Francisco de Paulo, na Tijuca. Todos os domingos, seu antigo patrão, esposa e filha iam visitá-la na enfermaria onde estava com mais algumas pessoas também já idosas; nunca lhe deixou que faltasse nada e, nas visitas, levava frutas e biscoitos para ela. Isso aconteceu até a morte desta. Também visitava com regularidade um outro amigo seu, chamado Sr. Borges, pai viúvo de uma moça que tinha seqüelas de meningite, no Rio Comprido. Todos os domingos havia como que uma rotina: ir à missa, almoçar em casa ou em casa de algum parente, depois, visitar a D. Custódia, depois o Sr. João Borges que, diabético, contraiu gangrena por uma pequena ferida causada por uma tesoura usada para cortar-lhe as unhas dos pés. Iam cortando-lhe os membros inferiores, mas a gangrena não se detinha e ele acabou por também falecer. No escritório, eram os chefes-proprietários, os dois irmãos Manoel e Arnaldo. Quem tratava da organização do mesmo, era este Sr. Emygdio e, tinha como ajudantes, seus dois filhos: Emygdinho e Arlindo. Já era bastante conhecido seu escritório na área imobiliária e seu nome bastante respeitado. Sempre em busca de novos investimentos nesse setor, ia o escritório de vento-e-popa. O Sr. Oliveira Lopes, como era conhecido no ramo, lá ia pela manhã e à tarde, passando em casa para almoçar e descansar um pouco. Seu irmão também fazia o mesmo. Quis, novamente o destino pregar-lhe outra peça: numa tarde, o Arnaldo não apareceu no escritório e tinha lá deixado um queijo sobre a sua mesa de trabalho. Já ao sair, o Manoel reparou no tal queijo e telefonou-lhe, mas ninguém atendia e, ele, resolveu ir pessoalmente, levar-lhe o embrulho em sua casa. Tocou várias vezes a campainha e nada, ninguém atendia. Ia deixar o queijo, pousado na soleira da porta, quando percebeu-se um cheiro de gás bastante forte e, vinha de dentro do apartamento do irmão. Chamou o Corpo de Bombeiros, que, imediatamente, arrombaram a porta, mas, para o Arnaldo já era tarde demais: ele jazia morto no chão da cozinha, perto do fogão, de onde vazou todo o gás que matou seu último irmão. A polícia compareceu ao local e constatou, através de perícia, morte acidental. Provavelmente, ele deve ter se deitado após o almoço para repousar e inalou o gás que vazava sem parar, deve ter acordado sufocado e sentido o cheiro, dirigiu-se à cozinha, onde o cheiro era fortíssimo e, caído desmaiado antes de conseguir fechar o registro do fogão. Ele faleceu em 1962 e foi enterrado, no jazigo do irmão, junto à sua cunhada e sobrinhas. Ao Manoel, restaram-lhe as irmãs e sobrinho(a)s para consolar-lhe mais esta dolorosa perda. Foi o testamentário do irmão e fez cumprir suas últimas vontades, principalmente a de doar todos os seus bens à instituições de caridade. |
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Freqüentava com regularidade o Liceu Literário Português, o Real Gabinete Português de Leitura e o Clube Ginástico. Era sócio remido em vários clubes e associações beneméritas também. Tinha vida social repleta. Gostava muito de tratar de negócios, por vezes, no horário de almoço na Confeitaria Colombo, na Rua Gonçalves Dias. Todos os comerciantes daquele pedaço do Centro do Rio o conheciam e o respeitavam: Largo da Carioca, Rua da Carioca, Rua Ramalho Ortigão, Rua Sete de Setembro, Rua do Ouvidor, etc. Por vezes lanchava também na Cavé. |
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Um pequeno detalhe sobre o seu caráter apresenta-se no caso de seu segundo casamento. Procurou pelo filho da futura esposa para pedir-lhe consentimento para casar-se com a sua mãe. Fez também com a futura esposa e a filha desta uma viagem à Portugal para apresentar-se à filha desta que lá residia e já era uma moça de 21 anos, à família desta e também para apresentá-las às suas irmãs de lá. Em 25 de abril de 1963, embarcou do Cais do Porto do Rio de Janeiro com as duas, no navio Aragon, da Mala Real Inglesa, que possuía mais dois transatlânticos, o Amazon e o Arlanza, chegando ao Cais de Lisboa, em Portugal em 05 de maio de 1963. Passearam por várias cidades portuguesas nesse período, tendo por companhia constante a outra filha da futura esposa, Maria Fernanda Alves Teixeira Barbosa, por quem se encantou e fazia gosto que esta se casasse com o seu sobrinho Zèzinho, a quem posteriormente a apresentou, mas, para seu desencanto, não conseguiu casá-los. Retornaram ao Brasil, saindo de Lisboa em 17 de outubro de 1963 e chegando ao Rio de Janeiro em 28 de outubro de 1963. Também lá gostava muito de fazer pic-nics com seus conhecidos e familiares e de freqüentar a uma praia de lá: Furadouro, onde mantinha alugada uma barraca em caráter permanete. Ia muito à Ovar, passeava pelas estradas de Válega á pé e ficava horas, sentado num tronco cortado de árvore no seu Pinharal, próximo de sua casa, cheirando folhas de eucalipto. Gostava também de freqüentar Têrmas, principalmente Vidago e Curia. |
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Fizeram outras viagens até lá, sempre num dos navios da então Mala Real Inglesa, conforme consta em seu passaporte. |
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No Brasil, mantinha a sua rotina casa-escritório durante a semana. Aos finais de semana visitar seus parentes, almoçando ou lanchando com eles, visitar seus doentes e, por vezes dar um longo passeio de carro pela orla marítima até o Recreio dos Bandeirantes, onde gostava muito de fazer pic-nics. Nessa época toda a área da Barra da Tijuca até o Recreio dos Bandeirantes era um grande areal, com estrada ainda de terra e, ele, maravilhado dizia: “Isto ainda vai ser uma segunda Copacabana!”. Para lá se chegar era necessário subir o Alto da Tijuca e pegar a Estrada do Joá. Nas férias escolares da menina, iam para Corrêas, passar de janeiro à março. A casa de lá já havia sofrido alterações, mas os jardins cheios de hortênsias, suas flores preferidas, dálias, rosas, camélias, etc, ladeados pela “grama de urso”, lá estavam ainda sempre cuidados com esmero. Na horta havia de tudo. Árvores frutíferas abundavam toda a propriedade: castanheiro, goiabeiras, caquizeiros, laranjeiras, limoeiros, mamoeiros, pitangueiras, jaboticabeiras, macieiras, etc. Ao fundo do terreno corria um rio onde havia um barranco com pés de café, bambus e uma longa trepadeira de xuxus que faziam um corredor de sombra. Tanques por todo o terreno também para a rega daquilo tudo. Havia apenas um galinheiro para consumo próprio de galinha e de ovos. Na frente da propriedade uma enorme cerca de hera, podada em arcos nos cinco portões da propriedade. Aos fundos da casa, residia o motorista num apartamento sobre a garagem,e atrás desta, a casa do jardineiro cuja esposa tratava da arrumação da casa. A cozinheira de Santa Teresa era levada para lá nesse período. Aparecia sempre bastante gente por lá: familiares e amigos. |
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A casa de Santa Teresa também sofreu modificações, ganhando uma garagem e um túnel que levava à um elevador, aumentando ao lado direito desta, uma alta torre. A escadaria de mármore foi modificada, assim como toda a parte da frente da casa, que ganhou escadas e caminhos cimentados, ladeando cada patamar de jardim, grades de ferro. À frente, jardineiras, separadas também por grades. O novo portão, também em ferro, levava ao túnel do elevador. |
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Era um homem sofisticado mas de hábitos simples, porém saudáveis. Tomava seu café da manhã, pontualmente às 7:00 horas. Antes do café, barbeava-se, escovava os dentes, bochechava com Anaphyon, e, então tomava seu banho de chuveiro. Usava um roupão para sair do banheiro e vestia-se no quarto. Suas camisas tinham punhos e colarinhos engomados, sendo estes, colocados na camisa por um botão de brilhante. Suas abotoaduras eram de ouro. Usava suspensórios ou cintos, dependendo da vontade. O passador das gravatas eram também de ouro com um brilhante na ponta. Usava um relógio Patek Phillip de ouro, com tampa com as suas iniciais e, prêso à casa do último botão de seu colete, por uma corrente também de ouro; o relógio, no bolsinho esquerdo do colete. Cores sempre sóbrias tinham os seus ternos. Só usava camisas de manga curta em casa. Por baixo das camisas usava camiseta de malha. Dormia com longos camisolões de linho branco debruados com uma pequena faixa azul.Usava ceroulas de linho branco. Lençóis nas camas, também só de linho branco bordados com monogramas. Aliás, os monogramas estavam em tudo: em toalhas de banho, toalhas de mesa, guardanapos, talheres de prata, pratos e travessas de cerâmica inglesa, aparelhos de chá ou de café em cerâmica chinesa ou em prata. O sabonete usado era sòmente o Phebo. Ao lavar as mãos, sempre as ensaboava e lavava a torneira, depois, voltava a ensaboar bem as mãos e as enxagüava, enxugando-as em seguida. No café da manhã procedia da seguinte forma: colocava o leite fervido, bem quente na xícara, jogava café até transbordar, colocava pedaços de pão dentro e, ia-os tirando com uma colher, tomando depois o café com leite.Comia mingau de aveia Quaker e uma maçã cozida. No almoço gostava de legumes cozidos, peixe cozido com a cabeça e, da água deste cozimento, um pirão, verduras e frutas, sendo maçã a sua preferida. Só tomava vinho (Casalinho tinto ou branco) ou água. Refrigerante não entrava em sua casa, no máximo, um suco natural de laranja. Comia bem e variava o cardápio a cada dia, preferindo os cozidos e os assados (galinha, carne ou porco). Com a chegada da menina, adotou para esta, o vinho branco doce Grandjó para as refeições. Todas as noites, antes de deitar-se, tomava um cálice de Vinho do Porto Ferreirinha. Escovava os dentes sempre após as refeições e, quando não era possível fazê-lo, bochechava-os com água. Detalhe: no tempo que viveu, nunca teve uma cárie ou um dente qualquer perdido e, apesar disso, ia com freqüência regular ao seu dentista, Dr. José Aguiar Dantas, no 9º andar do mesmo edifício de seu escritório para fazer manutenção. Também, dizia nunca ter sentido dor de espécie alguma, sequer uma dor de cabeça em toda a sua vida. Os mosquitos pousavam sobre ele e não o picavam!!! Aos domingos, sentava-se na sua cadeira de balanço, na iluminada varanda, toda com janelas de vidro, em Santa Teresa, e lia todos os jornais que existiam na época: Correio da Manhã, Jornal do Brasil, etc. À noite, ouvia pelo rádio a “Hora do Brasil” e, pela TV Tupi, assistia ao Repórter Esso. Em vez em quando ouvia também pelo rádio o humorístico “Balança Mas Não Cai”. Gostava de musicais em cinema ou teatro. Apreciava o ator Procópio Ferreira e sua filha Bibi. Ia bastantes vezes ao Teatro Gomes Freire, assisti-los. Gostava de visitar museus e monumentos históricos. Ia, com freqüência, à Sala Cecília Meireles ouvir concertos ou óperas e ao Teatro Municipal assistir à balés. Isto me lembra que, embora fosse um homem ligado à artes e religião católica, em suas casas não haviam instrumentos musicais,quadros, fotos em porta-retratos, imagens de santos(as), vitrolas ou discos. Na sua casa de Válega havia um piano, na de Santa Teresa, apenas uma estatueta do Pequeno Jornaleiro num pedestal de mármore em seu escritório e na de Corrêas, tapetes portugueses bordados colocados na parede como se fossem quadros. No Brasil, também gostava de passar períodos em têrmas de água como São Lourenço ou Caxambu no estado de Minas Gerais.
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Uma outra curiosidade sobre ele, foi a de que chegou a tirar carteira de motorista, mas só dirigiu um carro apenas uma vez na sua vida, porque esbarrou num ciclista na estrada de Válega. Nada aconteceu ao homem, mas ele jamais voltou a dirigir carro algum. |
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Em 1965, não chegou a viajar, em virtude da filha da esposa, Maria Fernanda haver-se casado com um primo-irmão, Artur Barbosa Ferreira. Em vez de lá ir, ofereceu viagem de lua-de-mel e hospedagem ao casal em sua casa de Santa Teresa. Assim, que terminada a cerimônia e a festa, os recém-casados embarcaram em seguida para o Brasil. Levou-os também à casa em Corrêas, passeou por toda a antiga Guanabara e também São Paulo, incluindo Santos. Em 1966 todo o estado da Guanabara foi varrido por um temporal de vários dias, causando muitos estragos e mortes. O local mais atingido foi justamente Santa Teresa, que praticamente ruiu; as casas pareciam “escorregar” morro abaixo e quem lá morava ficou totalmente “ilhado” por semanas. À sua casa nada aconteceu. Mas na de Corrêas, já foi diferente: pela primeira vez em tantos e tantos anos, o rio que passava atrás do terreno subiu de tal forma, que as águas invadiram a casa até poucos centímetros abaixo do teto. Assim que lhe foi possível, foi até lá ver os estragos e, desgostoso com o que viu, decidiu vender a propriedade. Passou a procurar por algo semelhante em Teresópolis, mas não chegou a realizar este empreendimento Voltou à Portugal em 19 de maio de 1966, lá chegando em 29 de maio. Encontrou-se com Maria Fernanda grávida. Não deixou de passear por lá, agora contando com mais um companheiro de passeio: Artur, marido da enteada. Um dos lugares, que sempre fez questão de ir quando lá estava, era ao Rei dos Leitões, saborear um bom leitão assado, no que o novo amigo o acompanhava com gosto. Embarcou de volta em 17 de outubro de 1966, chegando ao Brasil em 28 de outubro. Em 1967, queria fazer tudo rápido. Comentava que era a última vez em tudo e, apesar do medo que sentia dos aviões e, também em virtude, da enteada menor já estar no Ginásio e não estar podendo perder tantas aulas como dantes, tomou um avião no antigo Aeroporto do Galeão em 23 de junho de 1967 com destino à Lisboa. Maria Fernanda já havia tido uma filha e ele teve imensa alegria em a ir conhecer. Retornou em 18 de agosto e, de fato, nunca mais lá voltou! |
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